
Permaneça um tempo assim. Consegue? Ok. Quanto tempo? Pois eu, não consegui nem um minuto. Alguns segundos foram suficientes para que um sentimento de afogamento tomasse conta de mim. E olha que não estamos falando aqui de prender a respiração, ou ficar preso dentro de um elevador. Estamos apenas tentando reproduzir o que Jean-Dominique enfrentou por quase um ano e meio.
O quê? Um ano e meio? Com apenas a pálpebra do olho esquerdo? É, isso mesmo. E eu fico na dúvida sobre qual adjetivo dou à "aventura" que acabei de ler. Porque nem "trágico", nem "surpreendente", nem "encorajador", muito menos "emocionante", podem descrever o que este homem, ou sua alma, consegue nos passar através deste livro.
Jean-Dominique era redator-chefe da revista Elle, em Paris, quando aos 43 anos sofreu um acidente vascular cerebral que o deixou em coma durante 20 dias. Quando voltou, seu sistema motor encontrava-se deteriorado, sobrando apenas a pálpebra esquerda. Literalmente preso dentro de si, Jean-Dominique sofrera o que os médicos chamam de Locked-in Syndrome. Ou seja, a pessoa continua perfeitamente lúcida, mas seu corpo praticamente morre. Em uma prisão sem grades, nada mais é possível sem a ajuda de outros. Ou melhor, quase nada. Porque a mente, de forma quase milagrosa, aos poucos vai libertando Jean-Dominique de seu escafandro. Não que ele tenha retomado os movimentos. Mas sim, dentro de suas viagens imaginárias, ele retomou a liberdade que a vida, das formas mais criativas, consegue nos proporcionar.
O Escafandro e a Borboleta é um relato surpreendente de alguém que perdeu quase tudo, menos a profunda necessidade de viver. Ao final do livro, meio sem reação, me peguei com a seguinte pergunta pairando na minha mente, dela para ela própria: porque não voas mais? Será que é este escafandro que te prendes?
Jean-Dominique escreveu este livro com a ajuda de um sistema criado pela sua ortofonista. Ela criou uma ordem diferente para o alfabeto, das letras mais usadas no idioma francês para as menos usadas. Utilizando seu único instrumento, Jean-Dominique piscava sempre que Claude, sua fiel ajudante, falava a letra certa. Letra por letra, palavra por palavra, frase por frase, este livro foi produzido durante todas as manhãs por dois meses ininterruptos.
Dez dias após a publicação de seu livro, Jean-Dominique faleceu, de pneumonia.